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ENCONTRO
José Mariano Lima está campeando, mas veio a pé. Deixou a montaria, deixou as pistolas, inté a peixeira. Veio de botas cano alto que não é bobo. - Seis reses e um cavalo picados de cascavel em um ano bom de inverno destes! Ele imagina que as bichas tão no lajeiro do brejo onde ninguém vai que é perdido de tanta cobra. Leva só uma cabaça ornada de penas de araras, recheada por dentes de curumins e as primeiras sementes do milho formando um guizo de pajé; uma vara comprida e vai pitando: - Vou acabar com todas as cascavéis e outras aberrações do mal haver! O velho senta-se na pedra-uma, deslembrada da mais e mais antiga memória dos homens. Diz um palavreado noutras línguas ou em nenhuma língua, canta e balança o guizo e faz círculos concêntricos com um cigarrinho ciençado que acabou de fazer. Em duas horas são quinze chocalhos se ecoando. Treze nas proximidades e um no muito longe. E o outro frente ao de Zé Mariano. O velho silencia o seu chocalho. Mira no olho do in vê da cascavel mais erada de todas, uns quinze anéis no chocalhão nervoso. Inclina a cabeça para a direita três vezes e é secundado pela bicha, inclina para a esquerda e outra vez... quando parece que ela adormece: - Pras bandas de lá do segundo rio, ocê vai hoje e todas as mais ! Ocês num volta mais ! Num pica criança, nem velho, nem virgem, nem ninguém no dormindo. Mas pode invitar pisada de gente refeita ! Foi à toa, pisou em ocês, pode picar ! As quatorze cascavéis se vão, de contrato. Zé Mariano sente-se agora um pai do mato. No acordo do bom viver com as flores, e a floresta, e a roça e os ciclos, assunta o Riachão logo ali, vê com os oios do gavião pinhé que avoa, vê depois, com os oios dos urubus, que são os últimos no úlimo degrau do céu antes da altura adonde só chegam os anjos.Guarda autoridade máxima no seu olhar e nas ciências mais que são só dele. Sendo quinze guizos, faltou aquele do mais longe. Era da a mãe dos rastros, a serpentona de dezessete guizos que agora silenciava de vez. Não antes de expulsar seis cobrinhas, que as outras nove morreram dentro dela. O gavião pinhé levou duas duma vez pros filhim no ninho do alto do paredão. O sariguê, vacinado de berço, papou os restos da mãe do rastro e nas duas outras semanas foi atrás das cobras demais, papou duazinhas. Uma escapou por um triz da mucura pra cair nas garras da suindara. Restou umazinha que voltou para o pedral frio donde a água nasce, no fim do roçado e adonde moraram aquelas outras. Vai tomando corpo devagarinho e guardando veneno no fundo do pote e daqui a quinze anos quando Zé Mariano Lima vier duma caçada matar a sede vai pisar na sua contra calda e ser picado sem dó nem tempo e vai ter desmentida a crença de que tem o corpo fechado. Marconi Barros
Enviado por Marconi Barros em 18/09/2011
Alterado em 29/09/2011 |
